Neste tópico, vamos esclarecer como surgiram as alterações na raça Fila Brasileiro com relação às orelhas, criando-se o conceito de que as orelhas maiores e de inserção abaixo da linha dos olhos, seriam indicadores de raça pura. Tendência que veio se exacerbando, até chegar ao ponto em que hoje está o Fila Brasileiro, distanciando-se do Original.
Aviso aos usuários de celular: a legenda "ao lado" se refere às imagens que estão "acima"
Por volta dos anos 1950, já tem inicio um processo de comercialização de cães do interior de MG, para pessoas urbanas. Certamente percebendo o que mais agradava aos urbanóides, alguns fazendeiros passaram a produzir cães mais “courudos” e de maior porte e corpulência, do que aqueles cães tipo “aborígenes” que por ali se via.
A exemplo, a situação a seguir, por fotos, de cães de mesma origem, após alguns anos de “aprimoramento”. Origem primária, com Pedrinho do Engenho.
Acima: Pedrinho do Engenho, precursor da criação de José Gomes, de Varginha, com alguns de seus cães originais.
Abaixo, já na década de 1970, em fotografia do pesquisador Paulo Augusto Monteiro de Moura, o cão Lorde, de José Gomes, cerca de 20 anos depois, ou pelo menos 10 gerações, já delineia um novo perfil para a raça Fila Brasileiro.
Como explica Godinho, em seu livro “Cão Fila Brasileiro – Um Presente das Estrelas”, José Gomes visualizava o comércio de seus filhotes para os compradores urbanos, e procurou adequar o melhor possível o fenótipo a este mercado. Vê-se um cão mais “encorpado”, embora ainda “curto”, para os padrões atuais, mas já apresentando um item muito valorizado pelo mercado em formação: barbelas grandes, maiores do que o que se via no passado. Por isso considerado mais “puro”. Pode-se observar, no entanto, que as orelhas, pequenas, inseridas na linha dos olhos, e não abaixo, como é valorizado hoje na raça FB, ainda não haviam sido alteradas. Da mesma forma, ainda preservava a profundidade dos lábios, embora mais acentuada que seus ancestrais, mas não mais profunda que o comprimento do focinho.
Da mesma base genética em José Gomes, a família dos ingleses, Mr. Chalmers e Sra. Rosemaire Chalmers, adquire por indicação de Paulo S.Cruz, seu primeiro exemplar, Leo da Jaguara, abaixo, aproximadamente em 1958.
À esquerda Leo, com a Sra. Chalmeres. À direita, com Coronel Silvado a primeira fêmea, Mariazinha, matriz de todo o plantel do Canil Jaguara.
Outras fotos dos cães
Com este casal, os Chalmers viriam a praticar a consaguinidade por longos anos. Ainda na primeira geração, obtiveram cães absolutamente do tipo original, assim como em várias gerações consecutivas. Os primeiros filhotes de Leo e Mariazinha nasceram em 1959, gerando uma grande quantidade de exemplares, anos depois, por diversas gerações, perfeitamente de padrão, ou fenótipo, original.
Observe-se atentamente os padrão das orelhas e focinhos.
A partir do final da década de 1970, com quase 20 anos de criação, teve início – quem sabe continuidade do que já vinha acontecendo a partir de José Gomes – na criação Jaguara, a seleção para a produção de animais exóticos, no caso, de orelhas à moda do Bloodhoud. Afinal, o FB teria na sua ascendência, entre outras, esta raça inglesa - como diziam os entendidos.
É quando surge na criação mineira o cão Jumbo da Jaguara, abaixo, ainda com lábios moderados e orelhas pouco maiores que o “normal”:
Na sequência, veio uma geração a seguir. Veja abaixo o cão Jumbo II da Jaguara:
A performance do F.B. para o futuro estava lançada. Já apresentando grandes orelhas, diferentemente de seus ancestrais, e os lábios de maior profundidade que aqueles. Apesar de apático relativamente à guarda (Jumbo II era um animal manso, dócil com estranhos), este cão viria a se tornar um modelo de padrão, o qual a maioria de nós procuramos seguir, naquela época.
Alguns criadores, seguindo a mesma tendência, continuaram promovendo alterações ainda maiores no padrão (ou fenótipo), antigo, original. Alguns clubes, seguindo criadores influentes, adotaram a tendência.
Estudando-se melhor a raça Fila Brasileiro desde suas origens mais remotas, e a forma como se apresentava quando “descoberto” pela cinofilia oficial, comparando-se dezenas de fotografias antigas com as atuais, é possível a qualquer vivente de boa vontade deduzir que, a partir de exemplos como este, do Jumbo II, o cão na sua versão original teve sua escalada de extinção decretada. Sendo assim, cães com orelhas como os antigos, e fenótipos originais, passaram a ser descartados das pistas, considerados impuros, ou de qualidade inferior.
“Fila Puro”, foi a denominação que se deu aos novos filas, de grandes orelhas, lábios de cada vez maior profundidade, barbelas cada vez mais monumentais, e massa corporal “superior” a seus ancestrais. Com a alteração nas orelhas, alterava-se tudo; as articulações tornaram-se tão frouxas que os cães foram perdendo a capacidade de movimentação rápida, ágil, e alguns passaram a se movimentar como jangadas mal amarradas. O balanço do corpo, pesado, com as grandes orelhas, tornou-se o parâmetro para a estética atual: Fila Puro.
Dessa forma, com o passar dos anos, as orelhas, importante componente da cabeça para a caracterização racial no Fila, foram alteradas tanto quanto à forma quanto ao tamanho e posicionamento, comparativamente à linha dos olhos.
Observe acima imagens do cão Lorde, com seu proprietário José Gomes, década de 1970, onde se pode perceber a implantação, tamanho, formato e posicionamento das orelhas. Orelhas pequenas, na linha dos olhos.
Abaixo, mais algumas imagens de cães correspondentes ao Original Fila Brasileiro, com orelhas no formato e posicionamento desta raça, como era comum nos cães das décadas de 1940 até cerca de 1970.
Acima, as cabeças dos cães Aladim da Fazenda Poço Vermelho, e Abapuru do Caramonã, ambos de mesmo padrão. De frente, imagem da cabeça do cão Leo da Jaguara, década de 1950.
Orelhas de bloodhound não existiram nas origens da raça. Trata-se de um incremento moderno, resultado da criação de canil. Abaixo, diversos tipos e formatos de orelhas atuais, em comparação com cabeças “Originais”.
As imagens abaixo demonstram Filas que sofreram alterações nas orelhas (esquerda e meio). Os Filas Originais estão à direita.
independente da coloração do exemplar, o tipo moderno se evidencia nas orelhas. Em decorrência desta alteração, ocorrem alterações também no crânio, que passa a se apresentar como de outra raça, diferente do Original.
Para testar seus conhecimentos sobre o Fila Brasileiro e o Original Fila Brasileiro, identifique o Fila Brasileiro nas imagens abaixo.
E compare estas imagens com as inconfundíveis de cães de padrão original, abaixo.
O Original não se confunde com um Bloodhound, ainda que alguns exemplares tenham orelhas um pouco maiores que outros, não temos o exagero dos “modernos”, e a inserção das orelhas não se altera.
O cão Lorde, fotografado por Paulo Augusto M. Moura, aproximadamente década de 1970. Fotografias que se tornaram famosas e parâmetro para criações. Observe-se bem as orelhas deste cão, o quanto difere do Fila Brasileiro atual.
No caso do cão Lorde, as orelhas são pequenas, caso impossível de se confundir com as orelhas dos cães mais premiados no momento.
Tem sido enorme, e com muita propaganda, o esforço em usar imagens deste cão para convencer criadores novatos, ou até outros menos avisados, de que se está preservando o padrão racial de origem.
Em outras postagens, usamos estas fotografias em comparação com imagens de modernos cães da raça Fila Brasileiro, para maior elucidação dos fatos.